Estudantes comandam grande manifestação contra aumento da tarifa
Por Letícia Arcoverde 01/06/2007 às 20:54 - CMI

A quinta-feira foi escolhida pelos manifestantes por representar um dia histórico na luta contra o aumento da tarifa de ônibus, remetendo aos protestos de 2005 que acabaram conhecidos como a "Revolta da Catraca". Após a realização de manifestações ao longo da semana, o "Grande Ato" reuniu 3 mil pessoas no final da tarde de ontem, se estendeu por 5 horas nas ruas do centro de Florianópolis e foi acompanhado de perto por um efetivo de mil policiais. Desde cedo, o clima na Universidade Federal de Santa Catarina era de expectativa. Por volta do meio dia, um grupo de estudantes se reuniu em assembléia no campus da universidade, como fizeram durante todos os dias desde a instituição do aumento. Nela foram discutidos métodos para criar maior aproximação do movimento com a população, além de idéias para o protesto do final da tarde. Realizada em aberto, a assembléia manteve certa discrição. Segundo um dos coordenadores da reunião, há uma grande preocupação com policiais à paisana, os chamados P2. "Durante toda a semana houve muitos espalhados pela UFSC, mas é fácil descobrir quem são", disse o estudante. Maria e Vinícius são mãe e filho. Ambos participaram da assembléia e pretendem seguir o movimento no fim da tarde. Nascida no Ceará, Maria veio de São Paulo, onde morava há 30 anos, para um encontro de estudantes do qual o filho participava, há alguns meses. Lá teve contato com o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), e pôs-se a disposição deles. Formada em Serviço Social, mudou-se para Florianópolis e hoje faz na UFSC especialização em Educação de Jovens e Adultos do Campo, realizando trabalho com moradores da periferia da capital. "É lá que está boa parte da população do campo hoje em dia", diz ela. Sobre o transporte público, a senhora de 63 anos, comenta: "O rico não tem direito a ter transporte, ele tem transporte. Os pobres têm apenas o direito." Na frente do Colégio de Aplicação aconteceu o encontro de estudantes da UFSC e do próprio colégio, o qual tem forte participação no movimento. Instruções de como se comportar diante de confronto com a polícia foram distribuídas e após uma votação entre os participantes, foi decidido que o grupo seguiria em passeata pelo Saco dos Limões até chegar ao Terminal de Integração do Centro (Ticen). Carregando faixas e gritando palavras de ordem, o grupo seguiu pelas ruas, chamando a população para o protesto. "Vem, vem pra luta, vem. Contra o aumento", é o principal mote dos manifestantes. Ao longo do caminho nenhum cidadão atendeu ao chamado, mas moradores de casas por onde os estudantes passaram aprovaram a manifestação "Achei o aumento um absurdo. O movimento é correto, é um direito deles", disse uma senhora que saiu ao quintal de sua casa para ver a passeata, repetindo a opinião de várias outras pessoas nas ruas, inclusive a de um cobrador de ônibus. A passeata seguiu pacífica por todo o trajeto. Os manifestantes sinalizavam para os carros que formaram fila atrás do grupo, ajudando-os a ultrapassar o movimento. Muros e pontos de ônibus foram alvo de pichamento, ainda que outros manifestantes pedissem mais moderação. Sob o túnel que leva à baía sul, a passeata encontrou um grupo da tropa de choque da polícia. Continuaram seu caminho em direção ao Ticen, acompanhados pelos carros do Pelotão de Patrulhamento Tático.


O grupo ainda se reuniu em frente a Igreja Universal e seguiu pela avenida Hercílio Luz em direção ao Ticen. O cenário deixado era calmo, mas tenso. Manifestantes, como o trabalhador Édio Moura Junior, mostravam as marcas de balas de borracha às câmeras da imprensa. Resquícios de balas e bombas podiam ser achados nas ruas, junto com vidros quebrados e lixos queimados. O conflito dividia opiniões. O dono de uma loja de eletrônicos teve sua loja atingida por um pneu, e lamentou a ação dos manifestantes: "Tem que fazer isso na casa do Dário, não aqui nas nossas lojas. Eu também sou usuário (de ônibus)." Já a pedagoga Ione Andrade Cândida estava insatisfeita com a atuação da polícia: "Eu quero que a polícia me proteja sempre e só tem policial nessa hora. Pensei que estava numa guerra." Antes de chegar ao terminal de ônibus do centro da cidade, parte do grupo já havia dispersado. Embora poucos, os manifestantes se concentraram na avenida Paulo Fontes, sob o olhar atento de quase todo o efetivo de mil policiais. Parados, PMs, agentes do BOPE e a cavalaria da polícia cercaram os manifestantes pelo resto da noite. Do lado de fora da barreira, o professor Sandro Machado expressou forte opinião aos policiais. "Vocês são trabalhadores também e estão protegendo corruptos", ele gritou a um grupo da Polícia Militar. Um policial lhe respondeu que "achava melhor ele calar a boca?, mas o professor continuou, recebendo apoio de outras pessoas por perto. ?Eu estou protestando apenas. (...) É só pensar bem, essa gurizada que tá aí está lutando por um direito que é de vocês também. (...) Isso não é hora de obedecer autoridade, não. É hora de agir com consciência, vocês também são trabalhadores", disse ele, em meio a aplausos da população. Às 22h, eram poucos os manifestantes na rua. O grupo de teatro Árvore Sagrada, que acompanhou a passeata tocando berimbaus, comandava uma roda de capoeira, sob o olhar vigilante dos ainda numerosos policiais. Novos protestos estão previstos até que o aumento da tarifa seja revogado. Como diz um lema dos próprios manifestantes, difundido em um conhecido vídeo que documentou as ações de 2005, as mais de 3 mil pessoas que se reuniram na noite de quinta feira continuam a afirmar: "Amanhã vai ser maior".